Decolando com Andy Stott

Por Mauro Gaspar

Como alguns de alguns dos seus contemporâneos da cena eletrônica, Andy Stott é um impressionista. A música como paisagem sonora define e constrói o som de parte de uma leva de produtores – que vai de Burial a Actress, passando por Gold Panda, Tycho, Forest Swords e The Haxan Cloak, entre outros – que parece realizar, consciente ou inconscientemente, a convergência entre correntes que, desde a década de 1970, sempre estiveram próximas, mas nunca tão associadas: a eletrônica que parte de Kraftwerk e Afrika Baambaata e deságua na pista de dança, a ambient music de Brian Eno e o minimalismo americano de Steve Reich, Philip Glass e Terry Reich.

Desde Merciless, de 2006, Stott transita pelo universo quase infinito dos subgêneros criados pela volúpia reprodutora do mundo pop. Com músicas do naipe de “Come to Me”, “Hertzog” e “Choke”, o produtor inglês apresentou como credencial a capacidade de ser versátil e, ao mesmo tempo, ter uma sonoridade própria, que com os trabalhos seguintes vai ganhar mais força.

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“Bad Landing”, destaque da coletânea de singles EPs Unknown Exception, de 2008, é uma pequena obra-prima de 6m10 que ecoa o dubstep-ambient de Burial, mas que tem personalidade própria com o seu crescendo sutil de batidas compassadas e interferências sintetizadas que criam uma narrativa sonora ímpar.

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Passed Me By é um dos grandes discos de 2011, e certamente a obra mais coesa, autoral e impactante de Stott. Começando pela capa, uma foto de um nativo (um guerreiro Danakil como Cush, o amigo de Corto Maltese?), com suas cicatrizes rituais saltando da foto e marcando nossos olhos. E de “Signature” à faixa-título, essa marca é o passaporte que conduz o ouvinte por uma viagem por terrenos sonoros sombreados e escuros na maior parte do tempo. São vozes, ecos e respirações sobrepostas a uma base rítmica ralentada e marcial como o coração do ouvinte-viajante que flutua pelas paisagens hipnóticas de pérolas como “Execution” ou “New Ground”. Em suma, é um discaço e uma experiência sonora que nos tira de qualquer inércia.

Há quem se assuste com a reprodução infinita de gêneros, subgêneros e microgêneros da música eletrônica. Da minha parte, digo que acho muito bom viver nesse mundo sonoro bastardo e acompanhar os novos rebentos de ouvidos bem abertos.

O Festival Novas Frequências rola no Rio em dezembro. E eu estarei lá.

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Mauro Gaspar é jornalista, pesquisador e editor